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terça-feira, 31 de maio de 2005

Até quando? - Segunda parte




Se ainda vivêssemos o período em que achávamos que a revolução daria jeito em tudo estaríamos aqui agora esperando que ela chegasse para que uma nova aurora surgisse em nosso país. Infelizmente os processos revolucionários tais como os do século passado não existem mais e não sabemos que tipo de mobilização de massa este novo século irá produzir. No entanto há questões que devem ser tratadas com a dureza com que se tratariam num processo revolucionário, por exemplo:

Impunidade: há que se fazer alterações substanciais nas leis brasileiras. Não dá para um sujeito ser condenado a 30 anos de prisão, cumprir seis e sair por bom comportamento. Questões como bom comportamento, réu primário e cela especial precisam acabar. Criminoso é criminoso, seja rico, pobre, preto, branco, analfabeto ou doutor em qualquer coisa. O que torna alguém um marginal é o fato de cometer atos ilícitos. Assim, pouco se me dá se o bandido é nascido na favela, criado na miséria ou é um granfino da geração condomínio. Errou, camarada, cana! E pelo tempo que foi condenado.

Afonso Romano de Sant´Anna escreveu certa vez que nossa legislação permite que todos cometamos pelo menos um crime na vida. Ele falava exatamente sobre o fato de existir na lei a figura do réu primário. Ora, um sujeito que mata e estupra ou rouba a merenda escolar de 1.500 crianças é um cretino que merece ficar 10, 20 ou 30 anos na cadeia. Se ele nunca cometeu um crime antes, problema é dele. Errou, camarada, cana!! Pra valer. Pra ficar mesmo. Fugiu? Aumenta a pena em um terço. Fugiu de novo? Dobra. Se os criminosos começarem a ter medo da cadeia começarão a delinqüir menos.

Logicamente que uma política como essa deveria vir acompanhada de ampla reforma do sistema penitenciário brasileiro. O preso deveria trabalhar, estudar, produzir. Afinal, mente vazia é a oficina do diabo. Quanto mais ocupado, mais produtivo e mais valorizado como ser humano, maiores serão as chances de ressocialização;

Aparelho policial - Sou de opinião que se tem que pôr tudo abaixo e construir algo novo. Usando a imagem construída pelo Luis Eduardo Soares sobre a banda pôdre, há que se lembrar que às vezes, mesmo que se retire o que já apodreceu, os vermes já começaram a contaminar o lado que ainda está bom. Assim, mesmo concordando que em sua maioria os policiais são cidadãos de bem, não são corruptos e são conscientes do seu papel como agentes da lei, o fato concreto é que a estrutura montada é ruim. Primeiro não há um plano de carreira decente. Segundo os salários são miseráveis. Terceiro não há equipamentos e por aí se vai. Ou seja o lenga-lenga todo mundo conhece. Como resolver, se não dá pra jogar tudo ao chão? Algumas idéias: primeiro acho que o policial deveria ter um preparo de pelo menos dois anos antes de ir pra rua. Quem já fez artes marciais sabe que a média de tempo para sair da fase iniciante até chegar à graduação plena vai de cinco a oito anos, dependendo da arte que se pratique. Imagine um sujeito que entre para a polícia e nunca lutou nada na vida, nunca atirou, nunca teve aula de direção defensiva, nunca lidou com tática de guerrilha. Ora, não serão em seis meses que o sujeito estará preparado. Isso sem contar questões teóricas tais como direito, sociologia, história, direitos humanos entre outras questões que o sujeito deveria conhecer. Portanto, nada mais natural que houvesse aí uma preparação de no mínimo dois anos para o policial ir para a rua.

Neste momento, quando isso ocorresse e ele deixasse de ser um iniciante para tornar-se efetivamente um agente da lei ele deveria ter: um salário base na faixa de 2.500 a 3.000 reais; uma carta de crédito do governo para adquirir um imóvel onde bem entendesse; um plano de saúde razoável para si e seus familiares e bolsa de estudos para seus filhos em uma escola de qualidade. Com isso este policial não teria a maioria das preocupações que têm os reles mortais. Em contrapartida um crime cometido por um policial, fosse ele qual fosse, deveria ter pena dobrada (afinal o exemplo deve vir de cima) e, de semelhante modo, qualquer crime cometido contra um policial também teria sua pena dobrada.

Seria necessário desenvolver um sistema que permitisse que o policial que entrasse nos escalões superiores a a partir de cursos internos, merecimento e uma série de fatores pudesse galgar posições até chegar ao topo da carreira. Nem é preciso dizer que dentro dessa lógica seria totalmente proibido ao policial o desenvolvimento de qualquer atividade paralela sob o risco de demissão sumária. Isso tudo, obviamente, partindo-se da premissa de que a Polícia Militar e a Polícia Civil virariam um aparelho só, de preferência com outro nome, outra cara e outros símbolos.

É mister pensar que dentro de uma lógica sistêmica propostas como essa são apenas paliativos se não se inserirem num contexto maior de mudança política e social. Efetivamente o que o Brasil precisa é de um choque forte (por isso a menção aos processos revolucionários). A noção (também construída com o objetivo de manter tudo como está) de que somos um povo pacífico precisa ser combatida. Ser pacífico não significa ser passivo. Precisamos ser agentes de nossa própria história e buscar construir o caminho que, de fato, leve o Brasil a um patamar mais decente do este em que estamos vivendo.



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