Páginas

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Eleições 2010 e a agenda étnico-racial

Daqui poucos meses o calendário eleitoral será aberto e mais uma vez o espetáculo da democracia será vivido por milhões de brasileiros. Será uma eleição com poucas novidades e as mesmas caras que estão aí na política nacional há um bom tempo. Tudo caminha para que esta eleição tenha uma cara plebiscitária onde a comparação entre o governo Lula (Dilma) e o governo FHC (Serra) dê a tônica dos debates. Chatinho, não? Bastante!

Para nós, que atuamos no campo étnico-racial esta eleição, no entanto, não terá nada de chato. Nenhuma pasmaceira será tolerada quando os assuntos referentes às cotas, às políticas quilombolas, ao Estatuto da Igualdade Racial, às questões ligadas às religiões de matriz africana, às ações afirmativas entre outros, vierem à tona. Afinal, os temas étnico-raciais já fazem parte da agenda nacional do país há muito tempo e têm gerado acalorados debates nos últimos anos. 

Uma questão imediata será a manutenção ou término da Seppir. Com status de "especial" a Seppir está vinculada à Presidência da República desde sua criação mas, ao longo dos anos, por pelo menos três vezes sua existência foi colocada em dúvida. Para nós, no entanto, a constituição da Seppir é uma grande vitória política não só do povo negro mas também dos judeus, ciganos, indígenas, árabes e dos mais distintos grupamentos étnicos que compõem a população brasileira.

Ao longo dos anos temos sido críticos à forma como a Seppir é conduzida. Desde a total condescendência de Matilde Ribeiro com determinados grupos em detrimento de outros, até a atual truculência da gestão atual, o que vemos é que a Seppir aconteceu sem nunca ter havido um planejamento real de sua atuação no campo étnico-racial. Ou seja, a Seppir que deveria ser um órgão de formulação de políticas e proposição de ações acaba atuando na maioria das vezes de forma reativa e, quase sempre, imiscuindo-se em assuntos que não deveria provocando assim tensões desnecessárias e conflitos inócuos.

Indo além da manutenção da existência ou não da Seppir, temos que pensar na necessidade de dar um passo além. Ainda hoje, com todos os avanços havidos, o governo, seja ele qual forma, bate cabeça no que tange à questão étnico-racial e principalmente no que se refere às questões negras. Exemplo disso é a questão quilombola que ainda é confusa uma vez que a própria Seppir, o Incra e a Fundação Palmares agem no campo e nem sempre na mesma linha.

Independente do governante que entre precisaremos dar um passo além. Se por um lado não se discute mais a manutenção da Fundação Palmares e há acordo que a manutenção da Seppir é necessária, precisaremos avançar na política e na constituição de um grande acordo que permita uma nova gestão mais democratizada e, ao mesmo tempo uma atuação mais forte nas outras áreas do governo. 

A política étnico-racial não pode se restringir a apenas uma ou outra área do governo. Matilde Ribeiro, para justificar a ineficácia de sua gestão quase sempre se saia dizendo que a Seppir não é ministério meio, mas ministério fim. É meio ridículo, mas tem fundo de verdade quando se aplica a outro contexto. A Seppir poderá e deverá recuperar seu papel original e atuar não como concorrente aos movimentos sociais, mas como apoio às suas demandas e interlocutora privilegiada na esfera pública.

O ano de 2010 nos trará grandes desafios. O Supremo julgará a constitucionalidade das cotas. A Copa do Mundo será na África do Sul e este país e o continente ganharão mais visibilidade na mídia. A reconstrução do Haiti será uma agenda permanente. E os temas listados no segundo parágrafo permearão o debate midiático e eleitoral. Temos que estar preparados. Precisamos ter maturidade política para deixar de lado nossas questiúnculas em nome do bem maior, em favor da macropolítica, para que possamos alcançar objetivos mais amplos muito além de nomes, grupos ou tendências.

Um comentário:

Paulo Roberto disse...

Márcio,
Concordo com suas preocupações a respeito das ações dirigidas às nossas comunidades quilombolas. São muitas e diversas as instituições a gerar regras e conflitos e, enquanto isso, as populações quilombolas ressentem-se de uma política efetiva de resultados, para por fim às necessidades e urgências sociais verificadas.
Paulo Roberto